Genericamente pode-se definir o Dub como um processo criativo de edição e produção.  Consiste em criar material novo sobre um suporte preexistente e fisicamente idêntico. A ideia de Dub tem as suas raízes na música. Mais precisamente nos estúdios de música na Jamaica nos anos 60. Aqui um conjunto de produtores: King Tubby, Lee Scratch Perry e o Scientist entre outros, começaram a filtrar livremente a música reggae na mesa de mistura. Ecos, reverberações, eliminação de linhas vocais, ou pelo contrário, vozes cantadas e faladas por cima da música, vão não só definir este estilo como também influenciar a musica eletrónica posterior.
Casal da Cega in Dub, apresenta uma série de pinturas em tela e um conjunto de pinturas sobre fragmentos de cimento encontrados na rua. Estão na base deste conjunto de trabalhos imagens digitais recolhidas na pedreira com o mesmo nome. A pedreira Casal da Cega extrai pedra calcária na zona da Serra de Aire.  Aqui a pedra é retirada à natureza em enormes blocos geométricos, e posteriormente fragmentada e transformada em pequenas partes que no fim irão dar origem a peças decorativas, usadas abundantemente na construção.
Tal como uma trilha sonora prestes entrar numa mesa de mistura sob as mãos de king Tubby, as imagens recolhidas no verão do ano passado em Casal da Cega foram desmontadas em computador, antes de se transformarem em pintura. Efeitos de Photoshop, manipulações de cor, filtros vários foram usados por forma a baralhar a ordenação estabilizada dos pixéis do material original. Inscrevem-se sobre esta base novas imagens cuja a relação com a sua matriz original deixa de ser reconhecível. Este processo inicial de implosão da fotografia foi feito de uma forma absolutamente livre sem qualquer pressuposto formal procurado à partida. Apenas manipulando as variáveis do software. Cada pintura é uma configuração própria de estilhaços, onde fragmentos de uma determinada fotografia da paisagem original se misturam com o material sintetizado no ecrã do computador. Formas, padrões, texturas e cores, flutuam pelo espaço pictórico como estilhaços numa explosão.
Esta série de trabalhos continua a minha pesquisa em torno de imagens intervencionadas. Enquanto que na anterior série de pinturas Baixas Frequências, imagens noturnas eram intervencionadas por forma a gerar um vínculo de verossimilhança ficcional com o real, agora essas imagens são baralhadas, sacudidas, levantando um rasto de partículas que dificulte qualquer narração estável. Como se os altifalantes dos sound systems da Dubculture jamaicana levantassem uma nuvem de poeira por detrás da qual apenas pudéssemos antever fragmentos dos pesados bolcos de calcário em Casal da Cega.

Martinho Costa

Maio, 2016